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segunda-feira, 21 de maio de 2012

Uma questão de (mudança de) crenças

Sem dúvida que as crenças fazem parte do vocabulário psicoterapêutico…mas o que são? Como funcionam? O que fazer com elas?

São um dos conceitos basilares e fundamentais da psicologia cognitivo-comportamental; podem ser entendidas por atitudes, pressupostos, regras consolidados no processo de desenvolvimento, influenciados por pensamentos automáticos, e percepções que se constituem como esquemas mentais de funcionamento. As crenças determinam o modo pelo qual se responde aos estímulos em determinadas e particulares situações;  quando desajustadas as crenças são denominadas de irracionais.

Uma das teorias mais ecléticas da corrente comportamental(ista) é a Terapia Comportamental Emotiva-Racional (REBT/TCER) de Albert Ellis, que enfatizou a importância dos elementos emocionais e cognitivos, postulando que cognições, emoções e comportamentos estão intimamente ligados, interagindo e sobrepondo-se entre si, de forma complexa, reflectindo-se na saúde mental…

Stephen Palmer e Michael Neenan desenvolveram um modelo Cognitive Behavioural Coaching (CBC) de 7 passos, profundamente inspirado nas premissas de Ellis, aplicando-as ao processo de coaching. Paralelamente o mesmo autor (Neenan) e Dryden apresentaram o modelo (A-B-C-D-E). Resumindo:
 (A) – Avaliar as experiências vivenciais;
 (B) – Analisar as consequências emocionais e comportamentais, determinadas e influenciadas por convicções ou crenças;
 (C) – Identificar crenças desajustadas consideradas irracionais e geradoras de perturbação;
 (D) - Determinar as crenças que devem ser trabalhadas e substituídas;
 (E) – Promover mudança de atitude e de substituição de crenças irracionais, implicando uma nova visão do mundo, em especial do próprio indivíduo.

As técnicas mais comuns na TCER são tarefas cognitivas de leitura e auditivas, criação de imagens comportamentais e emocionais/evocativas. Trata-se de tornar o indivíduo consciente (insight cognitivo) das suas crenças irracionais e comportamento desajustado, através do treino sensorial acima descrito.

Existem também tarefas de consolidação – por exemplo as comportamentais, in vivo, em que testam a capacidade de tolerância a situações desafiantes, de modo a fortalecer as crenças racionais e as crenças emocionais – que promovem a consolidação do insight emocional.

Esta perspectiva contrasta com as correntes behavioristas radicais, concedendo um papel mais “empoderador” e activo ao indivíduo, na medida, em que se promove a auto-cura de uma forma “elegante” (TCER elegante ou preferencial) i.e. o indivíduo incorpora a mudança no seu próprio estilo de vida.

Na TCER parte-se do pressuposto que o indivíduo pode mudar as filosofias “anti-sociais e auto-destrutivas” para uma adaptação e reinserção na sociedade, sendo que o objectivo é maximizar a liberdade de escolha e realizar o potencial humano.

Deixo um desafio: pense sobre o que acredita acerca de si mesmo, depois decida o que quer manter para si e o que quer abandonar
“Se você acha que pode, ou que não pode fazer alguma coisa, você tem sempre razão. – Henry Ford”.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Acerca da Criança Interior…

É de facto inegável o contributo da escola psicodinâmica na hipnoterapia. As técnicas hipnoterapêuticas analíticas (hipnoanalíticas) são o reflexo dos conceitos e princípios das diferentes escolas psicodinâmicas aplicadas à indução de transe formal e à terapia propriamente dita.


O conceito de criança interior (Inner Child) é um conceito germinado da psicanálise, presente na psicologia analítica e na Gestalt, seja a criança “que surge” nas sessões de associação livre, seja na interpretação dos sonhos, num momento catártico como processo de libertação emocional, que na hipnose igualmente se denomina de ab-reacção.


Derivado das hostes analíticas, John Bradshaw desenvolve um conceito que denomina de criança interior. Ela é o registo dos conteúdos emocionais e desenvolvimentais, que processa informação e interpreta-a, influenciando os comportamentos actuais. Charles Whitfield fala de Child Within, Carl Jung falava de Criança Divina. Eric Berne na Análise Transaccional (AT) denominou essa instância apenas como Child (Criança). A teoria da Análise Transaccional (AT) de Eric Berne, refinou o conceito psicanalítico de criança, propondo a existência de três dimensões do sistema psicológico: Criança (a que existe dentro de nós), Adulto (parte racional objectiva) e o Pai (interiorização das atitudes das figuras dos pais).


Bradshaw, por sua vez, recuperou conceitos da AT e da teoria de desenvolvimento da personalidade (desenvolvimento psicossocial) de Erik Erikson, assim apresenta o conceito de criança interior, definido anteriormente, e acrescenta a figura de Adulto Interior e de Criança Adulta. Mais tarde, o mesmo autor reconhece contributos da psicologia quântica, nomeadamente os contributos de Stephen Wolinsky através da sua obra The Dark Side of the Inner Child: The Next Step. Curiosamente, Wolinsky aponta um lado menos radiante mas, igualmente, fascinante da Criança Interior e da sua influência na auto-sugestão do Indivíduo Adulto.


Bradshaw refere o acto de “re-parentalização” ou reparenting (healing the inner child) como promover-se “terapeuticamente” o papel de pai/mãe para com a criança do indivíduo.  A "Criança Interior" é uma eficaz técnica (analítica) utilizada em contexto hipnoterapêutico (e não só) que promove o acesso a uma instância pré-consciente, permitindo auto-conhecimento e aceitação catárticos…






quarta-feira, 2 de maio de 2012

Há mar e mar, há ir e voltar!

Slogan de Alexandre O’Neill (sim, o poeta surrealista). Sempre gostei dessa expressão, sempre gostei do mar; sobretudo da sua força aparentemente incontrolável, porém regido pelas leis das marés, pela vontade da lua, pelo movimento da terra. 
É incontornável (não) falar de marinheiros, para estes há que ir para o mar mesmo com ondas gigantescas, enfrentar monstros marinhos, quebrar cabos das tormentas, aguentar a nau, quem sabe descobrir novos mundos...

Cada partida reúne em si um carácter complexo e fluído, de múltiplas dimensões da experiência individual do marinheiro: uma nova percepção do mar e da terra, exploração de novos horizontes, desenvolvimento de novos dialectos, ligeiros escaldões solares, salitre empedernido na pele…
Depois de ir, há que rumar a bom porto e atracar seguramente no cais, lançando-se as cordas robustas (feitas de nós de Bowlby) ao amarrador, para segurar o navio junto aos cabeços nas bermas de atracção. Não se pense que este trabalho de amarrador é fácil, pois exige mais técnica do que força, há que ter uma postura adequada para evitar os perigos da amarração dos cabos – exige pois engenho e arte…
 A sensação de estar de volta que, em cada marinheiro navega, traz o conforto do retorno, tal figura “mahleriana” (Margaret Mahler) que corre para os braços da progenitora.

Regressa a casa (à base-segura), ao mesmo sítio de sempre, no entanto, o marinheiro chega diferente. E a vontade de ir volta a crescer… há mar e mar, há ir e voltar, para novamente partir e enfrentar novas marés.